sexta-feira, 4 de março de 2016

PRIMÁRIAS AMERICANAS Donald Trump, a preferência impreterível da oligarquia financeira e do imperialismo?



A
s prévias presidenciais norte-americanas deste ano tem chamado atenção pelo fato de candidaturas pouco convencionais terem surgido praticamente do nada; mais especificamente, Donald Trump de um lado e Bernie Sanders por outro, ambos eclipsando figuras conhecidas. Destaca-se, entretanto, a primeira não tanto por sua “excentricidade” ou pelos aspectos boçais, mas por indicar aonde trilha a política do imperialismo ianque ao partir em secções a sua própria carne. Com Trump, estaríamos defronte a um candidato “anti-establishment” como a opinião pública burguesa (e até da esquerda) quer fazer crer? Ou diante de um “aventureiro” que não tem nada a perder, ou simplesmente um “louco”? Qual é o poder de fogo desta nova direita que emerge do campo conservador republicano?

 O CANDIDATO FORJADO NO FÓRCEPS MURDOCHIANO1

Oriundo de família bilionária do ramo imobiliário, Trump adquiriu “popularidade” através de seu reality show (The apprentice, ou O Aprendiz) no início dos anos 2000. Criou a partir daí o seu marketing pessoal, disseminando massivamente sua ideia de “eficiência e honestidade” qualidades necessárias a um empresário bem-sucedido e acima das querelas partidárias. Talhou desta forma seu estereótipo de candidato independente.

Neste sentido, sua candidatura é, por assim dizer, multicolorida, haja vista que os últimos 25 anos tem revezado apoios tanto para republicanos como a democratas. Em 2008, por exemplo, fez grandes doações à campanha de Hillary Clinton, para combater Obama! Mais recentemente, no final de fevereiro, recebeu o apoio do “cavaleiro” da Ku Klux Klan, David Duke, dirigente da denominada organização da supremacia branca e o protestantismo (conhecidos como WASP).

Questionado por jornalistas, tergiversa: “não sei de nada sobre David Duke”, ou ainda “nem mesmo sei do que você está falando sobre supremacistas brancos”. Soma-se a isto, segundo o jornal neonazista The Daily Storner, o líder do Partido Nazista Norte-americano Rocky Suhayba incorporou-se a sua rede de apoiadores. Em seu editorial intitulado “Heil Donald Trump”, pede que “faça branca novamente a América”. Toda a escória racista parece ter se unido em torno da pré-candidatura de Trump.

A razão destas adesões situa-se naquilo que Trump define como “programa” de campanha cimentado no apelo nacional-populista, no belicismo radical, na afirmação do autoritarismo truculento, na defesa da tortura como método de “confissão” e o incremento da polícia para combater o “terrorismo”. Evidentemente que tais sínodos da reação evocam a simpatia da direita pró-militar, ainda mais que se consubstanciam como defensores do protecionismo econômico e se coloca na condição de anti-Wall Street ou contra a concepção financista da economia norte-americana. Aí fica a pergunta: trata-se de arrobo ou determinação dos capitalistas como classe? Ou divisão da mesma?

AS BASES SOCIAIS E POLÍTICAS DO “TRUMPISMO”

A campanha eleitoral de Trump debutou e solidificou-se estapeando seus adversários republicanos diretos e toda uma gama de políticos tradicionais e a elite econômica, qualificados como “fracassados”, em suas palavras. Um dos mais ricos e “cotáveis” para concorrer em novembro, Jeb Bush, desistiu no meio do caminho no dia 20 de fevereiro, após a apuração das primárias na Carolina do Sul ao ser humilhado nas urnas por Trump, atrás de Marco Rubio e Ted Cruz. Assim, foi conseguindo espetacularizar as modorrentas primárias. Forjada a imagem de “probo”, ganhou quase que imediatamente o “apoio popular” que o considera um exemplo “moralizador” da sociedade.

Mas onde estão suas bases?

Elas concentram-se nas camadas de trabalhadores marginalizados pelo Estado após a detonação da crise econômica de 2008 (os "sem assistência"), nas classes médias decadentes assoladas pelas drogas e ressentidas com Obama, setores empresariais desprezados pelos Republicanos vinculados a Wall Street, a direita conservadora do Tea Party (facção neofascista do Partido Republicano) com Sarah Palin à cabeça. Triunfou eleitoralmente em estados considerados moderados e laicos: Massachutes, no sul evangélico e conservador do Alabama e Geórgia. Conta, além do mais, com o importante apoio de figuras políticas do Partido Republicano, como o governador de New Jersey, Chris Christie o senador Jeff Sessions. Tem como álibi político sua grande popularidade midiática. Recentemente recebera apoio de artistas, jogadores de basquete e pugilistas: Clint Eastwood, Mike Tyson, Dennis Rodman estão neste rol...

Neste interim, o Public Policy Institute (uma espécie de DataFolha) divulgou uma pesquisa encomendada pela arquirreacionária “murdochiniana” Fox Entertainment Group, a qual revela que 66% dos apoiadores de Trump acreditam sumamente que Obama é muçulmano e que não nascera nos EUA (60%) [http://www.publicpolicypolling.com/main/2015/08/trump-supporters-think-obama-is-a-muslim-born-in-another-country.html]. O caminho vai pouco a pouco sendo carpido em favor do nacional-populismo de direita.

Houve, em outras palavras, um amplo reordenamento das primárias americanas com o objetivo de buscar uma ascensão nacional-populismo de direita, um movimento bastante sui generis nas hostes do Partido Republicano, descartando-o como possibilidade vitoriosa da corrida presidencial, dado o seu “baixo nível” e “ignorância” política assim vistos pelo grande capital.

“YOU’RE FIRED”!!!!2

Então, algo de “novo” se aproxima no front eleitoral americano?

Talvez, em parte.

Trump, ele mesmo parte integrante do velho e corrompido sistema bipartidário norte-americano, onde apenas os ricos decidem e triunfam (um candidato irá gastar em torno de 1 bilhão de dólares em sua campanha!!) e as candidaturas alternativas nem aspiram por qualquer possibilidade de seguir adiante no colégio eleitoral. O que vale e sempre vigeu foi o poder do dinheiro, da eminência plutocrática. O sistema é tão viciado que até o New York Times constatou que apenas 158 famílias ricaças decidem o futuro de outras 120 milhões de famílias no território americano [http://www.nytimes.com/interactive/2015/10/11/us/politics/2016-presidential-election-super-pac-donors.html]. No final, o capital irá definir quem assumirá a presidência e não há menor dúvida. De novidade, pode ser a quebra do revezamento Republicanos/Democratas no assento da Casa Branca, fato que não ocorre desde Franklin Roosevelt quem cumpriu quatro mandatos (hoje a 22ª Emenda limita o número de mandatos consecutivos de um mesmo presidente a dois).

Trump, neste contexto político, não foi um raio em céu azul ou desencadeou uma tempestade sem nuvens! Ele expôs cristalinamente a existência de um amplo leque de extrema-direita no país e revela a forte tendência de recrudescimento à fascistização do regime nos EUA e em todo o mundo: perseguição e assassinatos em massa de imigrantes na Europa, leis de enquadramento dos movimentos sociais, destruição das conquistas operárias em todo o mundo, intervenções militares diretas em países contrários ao establishment, fortalecimento de monopólios coloniais etc.

Apesar desta terrível realidade, o capital financeiro falará mais alto. Certamente que a oligarquia financeira imperialista ao final das eleições se defrontará com Trump, se valendo do conhecido bordão cunhado por este: “você está demitido!”. Você foi longe demais.

O martelo das primárias americanas será batido no próximo dia 15, quando ocorrerá a escolha dos delegados na Flórida (terra natal do guzano Marco Rubio) e Ohio (do governador John Kasich). Caso Trump derrotá-los a fatura estará liquidada...

Oligarquia financeira aposta suas fichas em Hillary
Ao que tudo indica, a oligarquia está apostando suas cartas em Hillary Clinton, concedendo um terceiro mandato aos Democratas como uma espécie de compensação pelo fato de Obama ter injetado trilhões de dólares para salvar o sistema financeiro americano e mundial, além do fato da agressividade diplomática da “dama de ferro” americana, ser propícia a intimidar adversários. Eis um estudo bastante interessante a respeito, feito pelo professor Michael Hudson: “Na sequência imediata da implosão financeira de 2008, os governos dos EUA e do Reino Unido tornaram-se de facto os donos dos gigantes financeiros falidos, como o Citibank, a AIG, o Royal Bank da Escócia, e o Banco Anglo-Irlandês. Através do fornecimento de enormes quantidades de fundos públicos, estes governos tornaram-se efetivamente os principais investidores destas instituições em colapso. Se não fosse por razões políticas e/ou ideológicas, podiam ter mantido facilmente a propriedade legal” [http://nowandfutures.com/large/HowToWriteDownTheDebtsAndRestructureTheFinancialSystem-hudson-michael-berlin-paper.pdf]. A possível vitória de Hillary é a sinalização da continuidade das intervenções militares em todo o planeta, atendendo os interesses dos neocom, dos falcões do Pentágono e da indústria bélica. Bernie Sanders, embora um pouco diferente, foi também um pêndulo para catapultar e referendar Hillary no Partido Democrata, o que ficou bem claro após a “super-terça”, a qual potencializou Trump e Hillary para serem nomeados candidatos à presidência dos EUA. Crises sistêmicas e intervenções militares serão a tônica do futuro governo ianque, quer seja para eliminar forças produtivas por meio de guerras, como para consolidar sua pilhagem colonial sobre todos os povos.

Notas:
        1- Rupert Murdoch: Em julho de 2011, Murdoch enfrentou acusações de que suas empresas, incluindo o jornal News of the World, se utilizavam da prática ilegal de escutas telefônicas, em telefones fixos e celulares da realeza, de celebridades e até de cidadãos comuns, para obter notícias, caracterizando violação de privacidade. Envolveu-se também em diversos casos de subornos e corrupção, e criar inúmeras “barrigas” jornalísticas.

           2-“Você está demitido!”.