quinta-feira, 6 de outubro de 2016

DO “MENSALÃO” ÀS “JORNADAS DE JUNHO DE 2013”; DA “LAVA JATO” AO GOLPE INSTITUCIONAL-MIDIÁTICO: as eleições municipais no marco da fascistização do regime político e o rearranjo das oligarquias no Brasil


A
s eleições municipais deixaram uma marca indelével, apesar de ser um terreno distorcido do nível de consciência das massas, a enorme quantidade de votos nulos, brancos e abstenções nos maiores colégios eleitorais brasileiros, como São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Porto Alegre... Contanto, antes de indicar um elemento de progressividade neste âmbito, revela de forma acachapante a continuidade da fraude política inaugurada com o “Mensalão” a partir de 2012; passou pelas tão enaltecidas “jornadas de junho” de 2013 quando a direita retrógrada mostrou seus dentes raivosos balizada pela mafiosa Rede Globo. Como nada fora provado contra o PT – o alvo estratégico de Joaquim Barbosa – nos processos farsas do “mensalão”, apenas uma estúpida tese de “domínio do fato”, era necessário algo mais profundo e espetacular. Criou-se a operação “lava jato” desde os bastidores do Departamento de Estado dos EUA, com o claro fito de criminalizar o PT e o conjunto da esquerda no Brasil em conluio com a grande mídia corporativa sob o címbalo obscuro de um admirador confesso de Benito Mussolini, o juizeco e dublê de justiceiro Sérgio Moro. Neste ínterim, surge a nefasta figura de Eduardo Cunha como presidente da Câmara quem, ao lado do PSDB, inviabilizou a governabilidade da frente popular. Não que Dilma dispusesse alguma pauta progressista aos “digníssimos” deputados; ao contrário, sua agenda era neoliberal e entreguista pari passu! Cunha aprova a censura nas eleições, com a limitação do tempo de propaganda e a participação de pequenos partidos de esquerda, restringindo-os a incríveis seis segundos! Uma lei piorada em relação àquela da ditadura militar, a odiada “Lei Falcão”...

DESPOLITIZAÇÃO E “DESPARTIDARIZAÇÃO”, DOIS ATRIBUTOS IMANENTES DO GOLPE INSTITUCIONAL POSTOS EM PRÁTICA

O crescente processo de judicialização da política esteve voltado para retroceder ainda mais a consciência das massas populares, incutindo-lhe a ideia perversa de que todos os políticos não prestam, os partidos são indiscriminadamente corruptos e que, portanto, a sociedade deles não necessita. Trata-se da antessala do fascismo. E assim foi feito. Nenhum dos candidatos patronais eleitos ou que foram ao segundo turno fizeram publicidade por seu partido; muito antes ao contrário, repeliram qualquer vínculo partidário. A “lei Cunha” visava precisamente isto! Com o fim do financiamento de empresas a candidatos (até uma porcentagem, impossível de controlar) predominaram os ricos empresários e os evangélicos, ambos picaretas, os quais obtiveram vitórias no primeiro turno em todo o território nacional, com raríssimas exceções (Marcelo Freixo no Rio de Janeiro).

A candidatura de João Dória
foi comprada a peso de ouro
pelo governo Alckmin...
Fato mais explícito do embuste marqueteiro é o da capital paulistana, João Dória. Bancado à mão de ferro pela Opus Dei do governador Alckmin e a custa da compra milionária dos votos na convenção partidária do PSDB – o candidato preferido era Serra – Dória alçou-se à prefeitura de São Paulo sem nunca ter qualquer representatividade social. Desde o início definiu-se como “apartidário”, um “empresário”, apresentador de TV e “escritor” de livros de autoajuda neoliberal (uma mediocridade de quinta categoria). Diferente do que muitos afirmam, o PSDB trafega imerso em crise: Alberto Goldman, vice-presidente nacional do tucanato, disse à serrista revista Exame que “Doria é uma desgraça para o PSDB... É um cidadão totalmente desprovido de escrúpulos, teve a sua vitória nas prévias pelo uso abusivo do poder econômico que tem e, infelizmente, pela ação do governo do Estado” (http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/doria-e-uma-desgraca-para-o-psdb-diz-alberto-goldman). Denúncias revelam que recebera financiamento de estados governados pelos tucanos, como o Paraná. Tal condição fez com que o ricaço fosse superado pelos votos nulos, brancos e abstenções (3.085.187 versus 3.096.304).

...contra seu desafeto Serra
Com este discurso “palatável” para ludibriar as massas populares subiu ao segundo turno no Rio de Janeiro o sobrinho do pantagruélico engolidor de dízimo Edir Macedo, o bispo Marcelo Crivella. Senador pelo PRB jamais se atou ao complô jurídico-policial que destituiu Dilma da presidência da República e a qualquer partido, mas sim ao “episcopado” da Igreja Universal, mesmo estando no governo Paes até o ano passado! Como resultado a sua rejeição foi gigantesca, os 1.866.621 votos nulos, brancos e abstenções superaram em muito os 842.201 do bispo. Não por acaso, nesse sentido calamitoso, Carlos Bolsonaro foi o vereador mais votado para a Câmara dos Vereadores... (todos os dados constam no site do TSE: http://divulga.tse.jus.br/oficial/index.html).

Por fora, correu a candidatura de Marcelo Freixo, enfrentando forças contrárias poderosíssimas como a máquina eleitoral do governo peemedebista, a rede Globo e o reacionarismo contumaz de Crivella, além do escasso e miserável tempo de propaganda eleitoral (seis segundos!!). Enfim, faz-se jus uma frente eleitoral de luta contra o fascismo religioso no Rio de Janeiro em defesa da candidatura de Freixo! O mesmo vale ressaltar a respeito de Edmilson Rodrigues em Belém estabelecendo o voto crítico no candidato do PSOL, mesmo com os limites de seu arcabouço programático, mas estará se defrontando contra a poderosa máquina estatal-eleitoral-golpista do PSDB de Zenaldo Coutinho.

E assim seguiu nas principais capitais do país. Ao lado de São Paulo e Rio de Janeiro, Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS), Curitiba (PR), Belém (PA), Cuiabá (MT), Campo Grande (MS), Salvador (BA) e Aracaju (SE) também tiveram mais votos em branco, nulos e abstenções do que o primeiro colocado nas eleições. O candidato mais votado em Belo Horizonte, João Leite (PSDB) ficou mais conhecido como distribuidor de bíblias a seus adversários quando jogador de futebol e muito menos por esta última qualificação. Mais um indício da desinformação política do eleitorado; João Leite atingiu 395.952 eleitores e Alexandre Kalil (PHS – e presidente do Atlético-MG de 2008 a 2014) 314.845, que somados 710.797 perdem feio para nulos, brancos e abstenções, 741.915! Com o detalhe que ambos são ligados ao futebol, ao Atlético Mineiro... Uma “polarização” sem precedentes!

Notório foi o caso em Porto Alegre, onde o atual vice-prefeito fez campanha na condição de “oposição”, sendo eleito em segundo lugar para o segundo turno! Sebastião Melo, do PMDB, escondeu acintosamente os partidos no meio da coligação, isto que tem como tutores os ultraneoliberais Sartori e Temer! O outro que foi ao segundo turno, Nelson Marchezan Junior, do PSDB, que há poucos meses estava no governo da prefeitura, também se postou como “candidato da renovação” sem citar seu partido na campanha! No final, a soma de votos brancos, nulos e abstenções ficou em 382.535, enquanto o primeiro lugar de Marchezan contabilizou 213.646. Para se ter uma ideia do pitoresco conservadorismo gaúcho, mais de dois terços dos vereadores (bancada do cimento e do asfalto) de Porto Alegre foram reeleitos.

A DEMOCRACIA PARA OS RICOS EMOLDURA O REGIME POLÍTICO PÓS-GOLPE CONSTITUCIONAL

Os partidos que mais cresceram foram os da direita mais comezinha minados de corruptos e indiciados pela “justiça”, claro na esteira do decréscimo de uma esquerda sordidamente criminalizada pelo sistema eleitoral reacionário. Na ordem PMDB, PSDB, PSD e PP tomaram grande parte dos votos petistas. De salientar, o PP, base de sustentação do governo usurpador de Temer, é o partido que mais tem políticos na alça da justiça, são 32 investigados (3 senadores, 18 deputados e 11 ex-deputados), 22 constam na lista da Odebrecht e 60% da executiva do partido está sob suspeita dos mais diversos crimes. O PP que possuía 474 prefeituras agora tem 495 (um aumento de 4,4%), vai desfrutar de um filão orçamentário em torno de 30 bilhões de Reais!!!! Que maravilha...

O PT, no quesito corrupção, não encabeça a lista, o líder é o DEM (69 políticos cassados), depois vem o PMDB (66 políticos cassados); segue o PSDB (com 58 políticos cassados); depois aparece o PP (com 26). O PT tem apenas 10 políticos cassados (a lista completa no site do TSE: https://www.reddit.com/r/brasil/comments/3yl174/elei%C3%A7%C3%B5es_2016_ranking_da_corrup%C3%A7%C3%A3o_por_partido/). Conquistar governos e cadeiras no parlamento pode ser a guarita de todos os políticos burgueses, agora amparados pela justiça, como é o caso do governo de bandidos protegidos por Temer.

Neste contexto de descalabro político, muitos “revolucionários” encantados com a avalanche de votos nulos, brancos e abstenções, embriagam-se no conto de fadas impressionista que se trata de uma resistência ao regime, o que explicita a contradição daqueles que defendem uma frente única contra o fascismo aberto com os processos do “mensalão” e da “Lava Jato”. Ou seja, a consigna de unidade tática funciona apenas como poeira lançada ao vento...

O capital financeiro, com a ajuda das oligarquias reacionárias, necessitava alijar o PT e seu programa neoliberal gradualista da administração do Estado, realinhando as diversas frações da burguesia através do recrudescimento do regime político via fascistização e judicialização seletiva da política, cuja finalidade é efetivar a transferência drástica de renda do trabalhador e do patrimônio nacional para os grandes rentistas internacionais através de uma agressiva linha ultraneoliberal.

Até uma pequena parcela de “resistência” pode haver – os votos do PT podem ter migrado para os nulos, brancos e abstenções e que certamente acontecerá uma nova enxurrada destes no segundo turno –, mas representa muito mais o jogo do próprio regime político imposto através do golpe parlamentar-jurídico-constitucional que apeou o governo Dilma do Planalto, do que um claro indício de rebeldia e consciência de amplas as massas. Num primeiro momento, infelizmente esta é a realidade, uma vez que praticamente não há movimento operário nas ruas (até a greve bancária é superestrutural) e, portanto, não existe uma “consciência para si” sem enfrentamento contra o governo golpista e suas instituições falidas, graças à política de arrefecimento da luta de classes da direção petista e dos movimentos sociais a ela vinculados nestes 13 anos de “Lulinha paz e amor”.