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uito se tem falado acerca do pensamento científico de Stephen Hawking,
recém-falecido, a partir do qual a mídia corporativa dominante rendeu-lhe
inúmeras homenagens lacrimosas póstumas. Claro, sempre com o extremo cuidado de
ocultar as raízes de seu amplo e vasto arcabouço teórico: a filosofia e sua
postura anticapitalista e anti-stablishment! Embrulha o estômago assistir
governos reacionários como o atual britânico render-lhe homenagens
“entusiásticas” destacando o seu lado “pop” como herdeiro de outro ícone pop:
Einstein. Hawking foi severo crítico da coroa britânica em política social e
econômica. O Universo de Hawking era bem mais vasto, muito além da sua
formulação “pop” cortês e singelamente apresentada pela burguesia em todo o
planeta! A visão de mundo do cientista sempre fora bastante crítica em relação
ao modo burguês de vida, muito em razão de sua mãe ter sido militante do
Partido Comunista Inglês na década de 30. Em sua maturidade, dera início a
estudos que o conduziram a negar que o Universo fora “criado” do zero, ou por
algum ente superior; porém não viveu o suficiente para nos contar...
A DESTRUIÇÃO NÃO SERÁ CAUSADA PELAS MÁQUINAS, MAS PELO CAPITALISMO!
Certa vez, quando perguntado como via um mundo cada vez mais
automatizado, substituindo velozmente o trabalho do Homem, afirmou
categoricamente que tal tendência era extremamente prejudicial que alimenta a
desigualdade social e apagava a flama humanitária que deveria ser acesa pela
ciência em prol do bem-estar de todos: “Todos
podem desfrutar de uma vida de pujante lazer caso a riqueza produzida pelas
máquinas seja compartilhada. Ou então, a maioria das pessoas pode acabar
miseravelmente pobre caso os proprietários das máquinas promovam um lobby
contra a distribuição de riquezas. Até agora, a tendência parece ser para a
segunda opção, em que os avanços da tecnologia conduzirão a uma sociedade cada
vez mais desigual.” (Ask
Me Anything, https://www.reddit.com/r/science/comments/3nyn5i/science_ama_series_stephen_hawking_ama_answers/2017).
Desvendara mistérios não apenas do Universo, mas o lado podre de
governos capitalistas como o britânico. Contumaz crítico do sistema de saúde
público de seu país, atacado frontalmente pelos neoliberais de plantão desde os
comandos de Margareth Thatcher, sem o qual jamais teria conseguido conviver com
a sua doença degenerativa, portanto, incansável defensor do sistema público de
saúde. Constantemente criticava os drásticos cortes orçamentários dos governos
de plantão à pesquisa científica, o descaso com a educação e a concentração de
renda nas mãos de poucos e os gastos astronômicos direcionados à indústria
bélica, principalmente durante a “Era Reagan” no período da Guerra Fria.
Recusou-se, diante da rainha da Inglaterra, o título de “Sir”! Posicionou-se
contra a guerra do Vietnã nos anos 70 do século passado. Há poucos anos, aderiu
ao boicote de artistas e intelectuais ao Estado gendarme de Israel em defesa da
Palestina: “Se eu participasse,
expressaria minha opinião de que a política do governo atual de Israel
provavelmente vai conduzir ao desastre”. Costumava lamentar-se com amigos,
o fato de nunca ter podido passar com sua cadeira de rodas sobre os pés da
“dama de ferro”. Em 1977, ao menos, teria feito isso sobre os pés do Príncipe
Charles... Denunciou a invasão pelos EUA contra o Iraque como operação
criminosa em 2003.
Sua postura em relação à tecnologia também deixara marcas indeléveis em
sua crítica ao sistema capitalista. A Inteligência Artificial (IA) sem controle
é um maleficio em mãos erradas: "O risco real da IA não é a malícia, mas a
competência. Uma IA superinteligente será extremamente eficaz em atingir seus
objetivos, e se esses objetivos não
forem os mesmos que os nossos, teremos problemas. Você provavelmente não é um maligno odiador de formigas que as pisoteia
por maldade, mas se você estiver encarregado de um projeto de hidrelétrica
verde e existir um formigueiro na área a ser inundada, sinto muito para as
formigas. Vamos não colocar a humanidade no lugar dessas formigas" (http://www.businessinsider.com/stephen-hawking-final-reddit-post-automation-inequality-2018-3,
grifo meu), ou seja, tal qual as formigas que “atrapalham” um projeto, os
humanos poderiam ser eliminados em benefício da objetividade tecnológica e o
mundo dos números voltados ao lucro e a superexploração de uma mão de obra cada
vez mais sobrepujada pela automação.
Em entrevista à BBC, em 2014, Hawking declarara que a IA é uma séria
ameaça à existência humana, uma vez que “(as
máquinas) avançariam por conta própria e se reprojetariam em ritmo sempre
crescente... Os humanos, limitados pela evolução biológica lenta, não
conseguiriam competir e seriam desbancados.” Evidentemente, falava deste
modo se a AI estiver atrelada ao modo de produção capitalista e suas grandes
corporações transnacionais preocupadas em desenvolver algoritmos que se
autoreproduziriam. Guerras seriam promovidas sob a lógica desenvolvimentista algorítmica,
matar-se-ia como nunca no pós-guerras mundiais. A tecnologia, segundo o
cientista projeta, seria tão perigosa e letal quanto bombas nucleares, mencionada
e analisada na “lista de Asilomar” que estuda os limites éticos e morais
oriundos dos avanços tecnológicos descontrolados e voltados para os anseios do
mercado e a indústria bélica (http://erichorvitz.com/AAAI_Presidential_Panel_2008-2009.htm).
Hawking foi um dos apoiadores e signatários desta lista, destacando que
máquinas não têm “culpa” per se pelas
desigualdades, mas quem as programa e a que interesses respondem, ou seja, o
capitalismo é está destruindo a Humanidade.
O EMBATE CONTRA O CONSERVADORISMO
No mundo acadêmico, sua principal característica era sua aversão aos rígidos
protocolos universitários e ao conservadorismo imanente das instituições.
Hawking interrompia colegas com os quais discordava em palestras e simpósios, o
que causava grande desconforto na “sociedade científica” que o considerava
arrogante e fora de padrão, aí pode estar incluso o preconceito por sua condição
física. Quando tinha novas formulações tão maior era a sua incisão nos cérebros
dos acadêmicos, provocados por perguntas que demonstravam estarem errados!
Em sua última obra, “The Grand Design”, publicada em 2010, avança para
a quebra de paradigmas e verdades absolutas, ao propor novos desígnios para o
Universo. Um deles é a força da luz que pode se comportar tanto como partícula
como onda de acordo com as propriedades do fóton; de acordo com a mecânica
quântica, o passado é uma possibilidade, pois uma partícula viaja de um ponto A
para o B, mas não observamos esse caminho, logo todos os caminhos são possíveis
para completar a trajetória; desenvolve uma interessantíssima teoria acerca do
“multiverso”, das cordas vibrantes em diferentes frequências, cada qual com uma
dimensão em que os múltiplos Universos estão situados. Revisa suas próprias
formulações, ao enfatizaer que um buraco negro não seria propriamente negro, mas
assinala uma propriedade intrínseca da matéria em movimento. Assim, a com a
teoria das cordas haveria não três dimensões, mas onze que dá origem a mais de
um Universo; e que o Universo observável foi criado por si mesmo, sem a mão de
um “deus”, determinado pelas leis da ciência (Natureza) de acordo com as leis
da termodinâmica nas quais estão enquadrados os buracos negros.
A CIÊNCIA COMO VERDADE RELATIVA, O CONTRÁRIO SERIA DOGMA, RELIGIOSA
Os confins do Universo a revelar como novas verdades relativas |
Pouco antes de falecer, Hawking estaria desenvolvendo importantes
postulados acerca da origem da existência, o que romperia os marcos da teoria
da relatividade clássica ao incluir o fator gravitacional quântico. Até então era
perfeitamente aceitável pelo Vaticano, já que destacava um início a partir de
um faixo de luz... O Papa João Paulo II afirmou que os astrofísicos deveriam se
abster de discutir o que houve antes do Big Bang porque este seria assunto restrito
à Igreja, da teologia.
Óbvio, Hawking não se conteve: “Antes
de entendermos a ciência, o lógico era acreditar que Deus criou o Universo,
mas, agora, a ciência oferece uma explicação mais convincente (...) Não há
nenhum Deus. Sou ateu. A religião crê em milagres, mas esses não são
compatíveis com a ciência” (Conferência no Festival Starmus, Tenerife,
Espanha, junho/2017). O atual Universo seria uma transição de um outro Universo
anterior, entendendo-se que o tempo não é algo linear, mas bidimensional possibilitando
desvendar os limites do período pré-Big Bang. Tal concepção corrobora com que
F. Engels afirmara, incrível, há mais de 140 anos! Reflete da seguinte forma o
mestre do materialismo: “as formas
fundamentais de todo ser são o espaço e o tempo, e um ser concebido fora do
tempo é tão absurdo como o seria um ser concebido fora do espaço.” (Anti-Duhring
(1877).
Somos produto inapelável das flutuações quânticas nos primeiros
momentos do Universo, nada se cria fora do âmbito da matéria e nesse campo se
dão as ações do Homem histórico, social e econômico, não há como o cientista se
abster destes fatores fundamentais... É no âmbito da vida e da morte que
permeia todo o Cosmo, o tenebroso conflito de astros destrói planetas, sistemas
solares e a partir de seus fragmentos novas formações se solidificam, a matéria
atômica não se desfaz, se renova. “A vida é apenas um vislumbre passageiro das
maravilhas que existem no Universo” (Carl Sagan). A Humanidade corresponde a
essa lei natural, uma sociedade acaba com violência (Revolução) para dar lugar
a uma nova, de outro tipo com a intervenção subjetiva do Homem para juntar
novamente seus fragmentos!