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ma questão
que toda a mídia corporativa oculta e faz questão de dissimular em relação ao
ex-ex Sérgio Moro: a sua promíscua relação com o Departamento de Estado dos
Estados Unidos! Há documentos que comprovam o envolvimento do ex-ex na política
do governo americano, expostos pelo site WikiLeaks onze anos atrás [1], que
comprovam a sua participação em cursos doutrinários, cujo nome fora dado como
programa Bridges Project (Projeto
Pontes) a fim de “consolidar
o treinamento bilateral [entre Estados Unidos e Brasil] para aplicação da lei”
[2]. Vários juristas brasileiros participaram, porque, segundo alegaram não
tinham capacidade para se valer do Código Penal e enfrentar a corrupção e os
esquemas de lavagem de dinheiro no Brasil. Como veremos adiante, foi a porta de
entrada para a intervenção americana nos assuntos brasileiros: espionagem e
doutrinação jurídica.
LAWFARE TREINANDO JUÍZES FEDERAIS E ESTADUAIS
[3]
O “Projeto
Pontes” [4], organizado pela “embaixadora” norte-americana Lisa Kubiske consistia
basicamente em “...assegurar treinamento a juízes federais e estaduais no Brasil para
enfrentar o financiamento ilícito de conduta criminosa” [5]. Tal
estratégia poderia ser “ser de longo prazo e coincidir com a formação de forças-tarefa de
treinamento... em São Paulo, Campo Grande ou Curitiba”. Liliana Ayalde, embaixadora dos EUA
no Brasil disse que “com a criação do Projeto Pontes, a embaixada ‘estava
agarrando a oportunidade de fazer parcerias com diversas entidades brasileiras
de aplicação da lei para o combate às crescentes ameaças transnacionais que
surgem no Brasil’” [6]. Em âmbito mundial, a Secretária de Estado de então,
Condoleezza Rice, enviava aportes financeiros para várias nações do mundo via Agência
para o desenvolvimento Internacional dos Estados Unidos (USAID), sob o
subterfúgio de “combate ao terrorismo”, na verdade inaugurando a lawfare em nível mundial.
O artigo da
Anpuh-RJ relata: “Ao longo do encontro, os participantes discutiram questões
como ‘cooperação internacional formal e informal’, ‘confisco de bens’, ‘métodos
de prova’, ‘delações premiadas’ e ‘uso do interrogatório como ferramenta’. E,
ao final da conferência, a delegação brasileira solicitou reiteradamente ‘treinamento
adicional’ relativo à ‘coleta de evidências’, ‘interrogatórios e entrevistas’, ‘práticas
em tribunais’ e, enfaticamente, o ‘modelo de força-tarefa’”. (p.5). Nada mais
claro!
Os procuradores da Lava Jato chefiados por Moro |
Não por
coincidência, cinco anos depois da conferência no Rio de Janeiro, e poucos
meses após a descoberta de espionagem contra a Petrobras, foi deflagrada a
Operação Lava Jato, então com o Poder Judiciário já capaz de levar adiante os
ensinamentos doutrinários do Departamento de Estado americano nas investigações
de Caixa 2 e na lavagem de dinheiro. Vários diretores da estatal brasileira
foram presos. Concomitante atuava, os lavajatistas causaram um baque econômico
no Brasil, com o desmonte operativo da Petrobras e das indústrias a ela
vinculadas, elevando a taxa de desemprego e falências no Brasil, instabilidade
institucional e econômica que interessava diretamente aos EUA!
Não podemos
esquecer, o governo Dilma foi alvo de espionagem feita pela NSA (Agência de
Segurança Nacional Norte-Americana), informações vazadas em 2013. Em 2015, o
Ministério Público ganhou aval dos Estados Unidos para rastrear em nível
internacional depósitos da construtora Odebrecht no exterior, alvo de supostos
pagamentos de propinas.
Praticamente
esfacelada a economia brasileira, o caminho para o golpe institucional
(“legal”) para a derrubada de Dilma Rousseff estava limpo para o vampiro Temer.
Este tratou logo de vender ativos da Petrobras e entregar o pré-sal a empresas
americanas e europeias! (Kanaan, s/data).
A Petrobrás foi a porta de entrada da lawfare no Brasil |
Se alguém
ainda achar que se trata de teoria da conspiração, então vamos aos fatos: basta
olhar o currículo lattes do ex-ex [7] que lá estará a doutrina americana para
os judiciários de todo o mundo. Em 2007, participou do International Visitors Program, organizado pelo Departamento de
Estado Norte-Americano, e fez visitas a agências e instituições dos EUA
encarregadas da prevenção e do combate à lavagem de dinheiro (Kanaan, s/data).
Seu chão sempre fora os Estados Unidos! No auge do lavajatismo dava palestras
em Washington e Pensilvânia, na condição de ser o “homem mais influente do
mundo”.
“SIMULAÇÃO E
PREPARAÇÃO DE TESTEMUNHAS”
Vários
brasileiros que operam a vara federal especializada em crimes contra o sistema
financeiro participaram dos cursos iniciados em 1998, cujo principal tema foi “simulação de preparação de
testemunha e interrogatório direto”, conforme revela o documento do WikiLeaks.
Procuradores e investigadores presentes ficaram extasiados com os
“ensinamentos” advindos dos treinamentos.
Assim resumindo: “Os
participantes elogiaram a ajuda em treinamento e solicitaram mais treinamento
para coleta de provas, interrogatório e entrevista, habilidades em situação de
tribunal e o modelo de força-tarefa. (…) vários comentaram que desejavam aprender
mais sobre o modelo proativo de força-tarefa; desenvolver melhor cooperação
entre procuradores e polícia e ganhar experiência direta no trabalho sobre
casos financeiros complexos de longo prazo.”
Para os agentes americanos “(…)
há necessidade continuada de assegurar treinamento a juízes federais e
estaduais no Brasil, e autoridades policiais para enfrentar o financiamento
ilícito de conduta criminosa. (…) Idealmente, o treinamento deve ser de longo
prazo e coincidir com a formação de forças-tarefa de treinamento. Dois grandes
centros urbanos com suporte judicial comprovado para casos de financiamento
ilícito, especialmente São Paulo, Campo Grande ou Curitiba, devem ser
selecionados como locação para esse tipo de treinamento.”
Segue o documento: “Assim sendo,
as forças-tarefas podem ser formadas e uma investigação real poderá ser usada
como base para o treinamento que sequencialmente evoluirá da investigação à
apresentação em tribunal e à conclusão do caso. Com isso, os brasileiros terão
experiência em campo do trabalho de uma força tarefa proativa num caso de
finanças ilícitas e darão acesso a especialistas dos EUA para orientação e
apoio em tempo real.”
NÃO HOUVE DIVERGÊNCIA DE CONTEÚDO
PROGRAMÁTICO COM BOLSONARO
Muito se tem
falado, inclusive muitas correntes de esquerda, encantadas com o conto de
sereia da Rede Globo e apaniguados, que o ex-ex saíra por cima de supostas
pugnas internas no governo Bolsonaro. Sérgio Moro (contumaz admirador de Mussolini), antes de mais nada foi, em
nível interno, o principal elemento que propiciou a eleição do outro ex
(capitão) e ‘ex’ (Presidente!), na condição de chefe da Lava Jato e de
destruidor das forças produtivas do país, facilitando a queda do governo
federal conduzido pelo PT. Verdadeira tragédia edípica, com o filho se
revoltando contra o pai!
O que se deve considerar é o papel que Moro vinha desempenhando desde que assumiu o
Ministério da Justiça, muito mais como prêmio pelo fato de ter tirado Lula da
corrida presidencial. Por que, durante quase toda a pandemia do coronavírus o
ex-ex praticamente sumira do cenário político? Nenhuma palavra para condenar
(ou referendar) os atos fascistas pró-AI-5. Tratou-se de retirada estratégica
para elaborar a sua saída do ministério! Vinha sendo orientado, palavra por
palavra pelo Departamento de Estado norte-americano, como deveria ser conduzido
o seu apeamento do pangaré adoentado!
A princípio,
Moro estava na condição subalterna de “advogado de defesa do Bolsonaro”, à
espera cômoda da sua tão almejada cadeira no STF, mesmo assim resistia em
saltar fora do cargo. Outrossim, fora convencido por determinação dos EUA, em
nome do capital especulativo e seus agentes que passam doravante a tutelar o
general Mourão como elemento executor de suas ordens, ao lado do cada vez mais
militarizado governo federal, em face a um modelo ultraneoliberal de economia
já claudicante. Não fosse esta deliberação do capital financeiro internacional,
o ex-ex ainda estaria como sabujo do bolsonarismo e lambendo botas dos generais
de pijama, ora substituindo de fato o ex-'ex'.
Por todas
estas questões elencadas acima, seria muito ingênuo imputar o aspecto eleitoral
para que o ex-ex fosse demitido pelo ex-‘ex’, ou que o primeiro eclipsava o
segundo! O enredo estava mais para uma briga de gangsteres do que disputa
republicana pelo poder. Ungido como peça chave no bolsonarismo, o império começou
a descartar o outro ex-‘ex’, para tanto Moro teria que deixar o governo cada
vez mais boçalizado e conduzido pelo gabinete do ódio olavista.
Temer,
Bolsonaro e o que vier pela frente são marcas indeléveis do continuísmo
tendencial golpista patrocinado pelos órgãos de inteligência do império
norte-americano a partir da deposição do governo Dilma, na busca de uma solução
que não seja a assunção de uma lumpen-burguesia desmoralizada para administrar
o país, mas que seja profundamente associada aos grandes grupos corporativos do
capital financeiro internacional.
Notas:
2
“Apresentadores norte-americanos discutiram vários aspectos relacionados à investigação
e ao processo de casos de finança ilícita e lavagem de dinheiro, incluindo
cooperação internacional formal e informal, ocultação e desvio de patrimônio,
métodos de prova, esquemas pirâmide, delação premiada, uso de interrogatório
direto como ferramenta e sugestões de como lidar com ONGs que se suspeite que
sejam usadas para financiamentos ilegais”. in https://wikileaks.org/
5
KANAAN, Gabriel Lecznieski. O Brasil na nira do Tio Sam: O Projeto Pontes e a participação
dos EUA no golpe de 2016. Anais do Encontro Internacional e XVIII Encontro de
História da Anpuh-RJ: História e parcerias. s/data https://www.encontro2018.rj.anpuh.org/resources/anais/8/1530472505_ARQUIVO_KANAAN,GabrielLecznieski.OBrasilnamiradoTioSam[ANPUHRJ].pdf
6
KANAAN: Havia trabalhado intensamente nos golpes de estado em Honduras (2009) e
no Paraguai (2012). “Temos sido cuidadosos em expressar nosso apoio público às
instituições
democráticas do Paraguai – não a Lugo pessoalmente”. A intervenção foi
executada via "Projeto Umbral" no Paraguai. pp.3-4 https://wikileaks.org/